Friday, November 1, 2024

25 - As muitas vestimentas do imperador Gasildo

 

Vigésimo quinto conto: As muitas vestimentas do imperador Gasildo

 

      O imperador de Gasildo teve certa vez a intenção de melhorar sua aparência, para que nas festas de seu palácio pudesse ter boa fama. Seus súditos então não paravam de dar-lhe sugestões das mais diversas, após algumas semanas sua aparência já era totalmente diferente, tão diferente que se alguém que antes o conhecesse não soubesse da mudança, de fato, não o reconheceria.

      Na história da humanidade a aparência sempre representou uma característica preponderante na aquisição de poder, honra, glória e até boa índole. Não precisamos nos abismar com esta informação, já que a visão é dos sentidos a principal fonte de percepção da realidade, assim, todos os seres humanos têm um fraco de deixar-se impressionar pelas aparências. Iverossivelmente é correto dizer que quem vê cara não vê coração, seria precipitação julgar um livro pela capa, não quero dizer com isto que o rei esteja errado em vislumbrar-se diante do espelho diariamente como um pavão abobalhado, mas que existe a possibilidade de que sejam distoantes alma e matéria.

      Gasildo confabulava certa feita com uma fada, pois tinha manias diversas, num pitoresco e exclusivo linguajar conversava com fadas, gnomos e houveram ocasiões, segundo as bocas mais ruidosas do palácio, em que Gasildo travara longos embates com gigantes de pedra. Seu dialeto tratava-se de um emaranhado confuso de termos, que em momentos específicos se transformavam em cânticos, como também podiam estar num termo tão antagônico ideológicamente que acabavam por perder qualquer possibilidade de nexo ou sentido.

     Esta fada, cujo nome era Vrina lhe concedia dicas e opiniões das mais diversas, no entanto neste dia bastou somente uma sessão de risos para que Gasildo percebesse, de maneira prodigiosa e perspicaz que algo estava errado: Seria com ele? Com ela? Com o mundo? Ou estaria ela desembestadamente louca?

-             Há! Há! Há! Vejo o que te fizeram estes palhaços do palácio, mais parece um bando de desnorteados que nunca vi igual, realmente meu rei, tu, portador de inteligência sem igual, não vistes como estás?

-             Como estou? Ora estas Vrina, estas fazendo picuinha de min? Não disponho de tempo para coisas fúteis como tuas banalidades, e pensar que tú sempre foste a melhor companhia que pudesse um humano ter...

-             Não te iludas, pois percrusta sendas enganosas, o que querem é te devorar, fazer com que pareças um polichinelo, para depois, somente depois te difamarem em público. É melhor que te preocupes com outras coisas que propriamente com tua aparência.

-             Desde o dia que julguei oportuno melhorar estas roupas me sinto de fato um tanto estranho, não conte à ninguém, pois este é segredo que ninguém sabe, estou contra minha vontade.

-             O quê?

-             Me desiludi já , nem precisas tu de largas explanações para me convencer que esta farsa é ilusória. – Quando o rei diz esta farsa aponta suas vestes, que mais pareciam de um palhaço. Extremamente abatido deixa seus aposentos e vai em direção ao grande salão do castelo, em busca de qualquer distração.

      Em verdade, aquele dia foi importante, pois deu uma esperança ao rei, que se deixava entristecer profundamente pela maneira como se deixava influenciar por opiniões dos outros. O dilema se prolongou por mais duas semanas, até que num belo dia, logo pela manhã sem se aperceber apareceram dois gnomos ao seu lado, um deles tinha um chapéu vermelho o outro verde.

-             É este o homem?

-             Sim acho que sim, pela cara de pasmado e um certo ar distante nota-se que parece tristonho.

-             Pelos Deuses! Quem ou o quê são vocês? Quê chapéus horríveis, até parecem bruxos ou feiticeiros.

-             Somos Gnomos.

-             Há sim, Gnomos... E quê querem comigo? Já não basta minha tristeza, esta que me acompanha dia a dia juntamente com meus dilemas.

-             Claro, claro... Compreendemos. – Disse um dos gnomos colocando uma das pequeninas mãos no cotovelo, e com a outra o queixo, transmitindo uma expressão de sabedoria e agilidade intelectual. – O que queremos é saber com quê raios de gente estás andando, pois teus trajes mais parecem orelhas de coelho gigantescas, com estribos de cavalo estragados que propriamente roupa, aconselhamos urgentemente que troque isto aí, aliás nunca vi um rei vestir-se de maneira tão inusitada e até desfavorável à sua boa reputação.

-             Põe em dúvida minha reputação? Acaso não valorizas tua própria vida?

-             De princípio convém dizer que sou, como meu colega, um ser evanescente, feito de ectoplasma, portanto não nos submetemos às mesmas leis que regem o mundo dos homens, não julgues que podes matar um gnomo. Quanto ao caso que está em pauta é bom dizer logo que o conselho é trajar-se bem, pois sabe-se que mesmo que o espírito seja nobre e sincero temos de convir que os olhos são a ferramenta mais potentente do homem.

-             E quê relação põe dos olhos com minha reputação?

-             O que os olhos não vêem o coração não sente, o senhor deve trajar-se segundo nossas recomendações, do contrário poderás até, em último caso, perder o poder.

     Estas últimas palavras foram suficientes para deixar Gasildo aterrado, não imaginava que suas atitudes pudessem ter resultantes drásticas como estas, deste modo decidiu seguir os conselhos daqueles guinomos, que naquele momento lhe pareceram esbeltos e explendorosos. Foi com grande honra que adotou ao pé da letra tudo o que lhe fora citado à respeito de como vestir-se adequadamente.

      Para a surpresa de todos, numa das muitas festas concedidas pelos nobres das circunstâncias ocorreu que o rei portava um longo chapéu, uma camisa xadrez e botas de couro, em seu cinturão haviam muitas sacolinhas, que segundo ele eram pós mágicos e poções, cada qual com uma função específica. Foi uma zoeira tremenda, todos riram do rei, muitos não  tiveram sequer a preocupação de disfarçar, fato que custou-lhes a própria vida.

      Não tardou muito para que o rei se apercebesse que havia cometido grande erro, pois mesmo que aquelas roupas fossem adequadas não eram aconselháveis para todas as ocasiões, concluiu disto que a roupa em si não era fator importante para o bom sucesso e poder, mas sim adequação aos diferentes grupos e modalidades culturais. Não obstante esta conclusão foi tão tardia quando inútil, pois a fama do rei passou a ser de louco varrido e pessoa com falta de personalidade, o que segundo minha opinião não ha base sólida nestas falácias pois o rei buscava em si um valor que lhe tornasse mais famoso, não sabia porém que é a alma quem cresce e domina o mundo e não qualquer destas mesquinharias que são as aparências.

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