OITAVO CONTO: O marketing ganhou.
A cidade era
assolada por pessoas estranhas, uns diziam que eram estrangeiros, mas outros
acreditavam se defuntos de corredores antigos, sempre apareciam na noite
cercados de sombras.
A cidade era
pequena, com apenas uma praça e igreja como atração, nas noites assombrosamente
obscuras a praça tornava-se local de aparições estranhas, os moleques faziam
galhofa de tal acontecimentos, enquanto que todos os outros mentiam uns aos
outros dando todo tipo de explicações para tal acontecimento.
O próprio
prefeito fizera vários discursos no caramanchão da pracinha, no intuito de
amenizar a situação, pois o futuro de sua cidade dependia exclusivamente de
investimentos provindo de cidades vizinhas, porém estes investimentos diminuíam
à medida que aumentavam as fofocas e lendas que eram criadas em torno às
aparições medonhas.
Neste
contexto nos deparamos com um interessante personagem, que é um senhor de seus
40 anos, sempre bem alinhado, com comportamento bastante refinado, sendo ele um
corredor fundista de grande apreço na cidade, seus modos são bastante educados,
e sempre que pode disputa corridas em outras cidades, gosta muito de correr, e
inclusive lera mais de 5 vezes ( exatamente 7 ) este livro que está em suas mão
achando espantoso o fato de estar inserido no livro o conto que conta sua
própria história, não entendeu ao ler o livro como o autor conseguira saber
detalhes tão importantes de sua vida. Pois justo no momento em que estava com
grande deleite lendo o livro “O correr e suas nuanças” pela oitava vez alguém
toca-lhe a campainha da casa. Achou muito estranho aquilo, pois já eram horas
de todos recolherem-se, e ficou com determinado receio de abrir a porta, pois sabia parcialmente do boato que corria
na cidade.
Abrindo a
porta, deixando a correntinha presa para quaisquer eventualidades negativas,
olhou através da fresta, e foi de grande surpresa que viu o prefeito em trajes
bastante indecentes para andar nas ruas, pois trajava ele um pijama com
desenhos de trens por toda a extensão. Fingindo não ficar surpreso e segurando
uma possível gargalhada Roberto, o qual é o nome de nosso personagem, abriu a
porta deixando entrar o prefeito, que estava bastante eufórico, e parecia
bastante espavorido.
-
Roberto, tenho que dizer-te algumas palavras com
urgência. – Disse o prefeito sem saber por onde começar.
-
Quê foi homem? – Perguntou enfaticamente Roberto.
-
Há mortos andando por aí...
-
Então acredita nestas ingênuas proposições.
-
Como não se vi com meus próprios olhos?
-
Não há de ser verdade isso.
-
Então ou estou louco ou não explico tais
acontecimentos.
-
Julgo ser loucura.
-
Pois então venha você à minha casa e verá porquê vim
buscar-te.
-
Como assim?
-
Um corredor já falecido, disse haver vivido nesta
cidade há muito tempo e parece querer travar um embate com você.
-
Mas eu não conheço nenhum corredor que não seja eu
mesmo.
-
Pois não têm importância isto, apenas venha e verá.
Roberto
apressou-se em portar-se adequadamente para a ocasião, acreditando ser uma
farsa deu uma exagerada ênfase às palavras pronunciadas ao prefeito de forma a
assustá-lo cada vez mais, pois falava de cadáveres, mortos, zumbis e tudo mais
com grande suspense. Chegando à casa, em
meio à penumbra da sala, encontrou Roberto uma figura bastante singular sentada
à lareira já apagada da sala, sem receios logo sentou-se diante da figura
acreditando tudo ser uma armação para sua pessoa, o prefeito escondia-se ora
totalmente ora parcialmente detrás da porta da cozinha. Sentindo um cheiro
fétido Roberto apressou-se em falar algo:
-
Quê fazes neste mundo?
-
Com amigos a pedir algo.
-
Não entendo.
-
Há muito tempo esta fora cidade pacata, mas agora, vejo
que já há um corredor, e por assim dizer isso é pequeno desenvolvimento.
-
Corro porque gosto.
-
Eu também o fazia porque gostava.
-
Todos fazem porque gostam – Disse Roberto com ar de
superioridade por suas inteligentes respostas.
-
Não! – Gritou impetuosamente o defunto, de forma que
saísse um hálito quente e malcheiroso de suas entranhas – Há gente que não sabe
porque o faz, e a estes ignorantes devemos nos ater a explicar. Por este motivo
viemos nós à este mundo pelo qual já vivemos, há gente que têm medo de nós, mas
somos corredores como qualquer outro, talvez como você.
-
Acredito na veracidade de suas palavras – Disse Roberto
tentando sem êxito aparentar calma, pois já estava bastante trêmulo e
esforçava-se para articular as palavras. – Mas creio não ser necessário tal
intrusão, até desrespeitoso eu diria, já que o lugar de corredor morto é no
cemitério.
-
Está sendo bastante certo, porém deve aperceber-se de
que estamos voltando para alertar você de que a corrida ultimamente vêm
perdendo seus valores mais graciosos, veja bem que gostamos tanto de correr que
queremos ajudar aqueles que ainda o podem fazer. Não recorda-se da lenda de
Filípidis.
-
Sim, creio haver lido isto em algum livro.
-
Veja como, nesta lenda há grande valor heróico, e note
como hoje perdeu-se este valor.
-
Não acredito – Contrariou Roberto.
-
Sua opinião é diversa do que ocorre.
-
Pois que seja, continuarei não acreditando.
-
Por quê – Perguntou o cadáver curioso.
-
Eu – Disse Roberto querendo fazer certo misto de
sapiência com superioridade intelectual, o que deixava o morto por certo
bastante inquieto, já que ele deveria ser o mais impressionante membro dos
corredores por haver feito tão grande esforço para ressuscitar-se – Não me
sinto influenciado por palavras de outrem, e nisto consiste em achar a corrida
um ato de atroz heroísmo.
-
Assim queremos que seja, pois se você fizer esta
propaganda lhe enviaremos 15% das rendas de nossas organizações.
-
Quê organizações seriam estas de que desconheço?
-
Temos uma delas que chama-se Defunto`s e companhia, responsável por corridas de longa distância.
-
Há é? – Perguntou sarcasticamente Roberto, já mais
aliviado com a amistosidade da conversa, enquanto o prefeito se escondia cada
vez mais trêmulo – De quê trata-se isto especificadamente?
-
Serve para ver quem consegue correr invisivelmente na
frente de um corredor ainda vivo, e também para quem faz mais propagandas de
corrida através de telemarketing.
-
Mas que coisa mais horrível isso, vocês não tem outra
coisa a fazer?
-
Pois neste intento vim conversar com você.
-
Considero tal explanação acabada – Falou Roberto
achando o morto de um gênio insuportável, pois jamais suportara a influência da
mídia sobre a vida das pessoas.
-
Assim está, espero que leve em consideração algumas
idéias que trocamos.
-
Claro, claro... – Disse Roberto com um olhar de
desprezo.
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