Thursday, October 31, 2024

8 - O marketing ganhou

 OITAVO CONTO: O marketing ganhou.

 

      A cidade era assolada por pessoas estranhas, uns diziam que eram estrangeiros, mas outros acreditavam se defuntos de corredores antigos, sempre apareciam na noite cercados de sombras.

       A cidade era pequena, com apenas uma praça e igreja como atração, nas noites assombrosamente obscuras a praça tornava-se local de aparições estranhas, os moleques faziam galhofa de tal acontecimentos, enquanto que todos os outros mentiam uns aos outros dando todo tipo de explicações para tal acontecimento.

      O próprio prefeito fizera vários discursos no caramanchão da pracinha, no intuito de amenizar a situação, pois o futuro de sua cidade dependia exclusivamente de investimentos provindo de cidades vizinhas, porém estes investimentos diminuíam à medida que aumentavam as fofocas e lendas que eram criadas em torno às aparições medonhas.

       Neste contexto nos deparamos com um interessante personagem, que é um senhor de seus 40 anos, sempre bem alinhado, com comportamento bastante refinado, sendo ele um corredor fundista de grande apreço na cidade, seus modos são bastante educados, e sempre que pode disputa corridas em outras cidades, gosta muito de correr, e inclusive lera mais de 5 vezes ( exatamente 7 ) este livro que está em suas mão achando espantoso o fato de estar inserido no livro o conto que conta sua própria história, não entendeu ao ler o livro como o autor conseguira saber detalhes tão importantes de sua vida. Pois justo no momento em que estava com grande deleite lendo o livro “O correr e suas nuanças” pela oitava vez alguém toca-lhe a campainha da casa. Achou muito estranho aquilo, pois já eram horas de todos recolherem-se, e ficou com determinado receio de abrir a porta,  pois sabia parcialmente do boato que corria na cidade.

      Abrindo a porta, deixando a correntinha presa para quaisquer eventualidades negativas, olhou através da fresta, e foi de grande surpresa que viu o prefeito em trajes bastante indecentes para andar nas ruas, pois trajava ele um pijama com desenhos de trens por toda a extensão. Fingindo não ficar surpreso e segurando uma possível gargalhada Roberto, o qual é o nome de nosso personagem, abriu a porta deixando entrar o prefeito, que estava bastante eufórico, e parecia bastante espavorido.

-          Roberto, tenho que dizer-te algumas palavras com urgência. – Disse o prefeito sem saber por onde começar.

-          Quê foi homem? – Perguntou enfaticamente Roberto.

-          Há mortos andando por aí...

-          Então acredita nestas ingênuas proposições.

-          Como não se vi com meus próprios olhos?

-          Não há de ser verdade isso.

-          Então ou estou louco ou não explico tais acontecimentos.

-          Julgo ser loucura.

-          Pois então venha você à minha casa e verá porquê vim buscar-te.

-          Como assim?

-          Um corredor já falecido, disse haver vivido nesta cidade há muito tempo e parece querer travar um embate com você.

-          Mas eu não conheço nenhum corredor que não seja eu mesmo.

-          Pois não têm importância isto, apenas venha e verá.

       Roberto apressou-se em portar-se adequadamente para a ocasião, acreditando ser uma farsa deu uma exagerada ênfase às palavras pronunciadas ao prefeito de forma a assustá-lo cada vez mais, pois falava de cadáveres, mortos, zumbis e tudo mais com grande suspense.  Chegando à casa, em meio à penumbra da sala, encontrou Roberto uma figura bastante singular sentada à lareira já apagada da sala, sem receios logo sentou-se diante da figura acreditando tudo ser uma armação para sua pessoa, o prefeito escondia-se ora totalmente ora parcialmente detrás da porta da cozinha. Sentindo um cheiro fétido Roberto apressou-se em falar algo:

-          Quê fazes neste mundo?

-          Com amigos a pedir algo.

-          Não entendo.

-          Há muito tempo esta fora cidade pacata, mas agora, vejo que já há um corredor, e por assim dizer isso é pequeno desenvolvimento.

-          Corro porque gosto.

-          Eu também o fazia porque gostava.

-          Todos fazem porque gostam – Disse Roberto com ar de superioridade por suas inteligentes respostas.

-          Não! – Gritou impetuosamente o defunto, de forma que saísse um hálito quente e malcheiroso de suas entranhas – Há gente que não sabe porque o faz, e a estes ignorantes devemos nos ater a explicar. Por este motivo viemos nós à este mundo pelo qual já vivemos, há gente que têm medo de nós, mas somos corredores como qualquer outro, talvez como você.

-          Acredito na veracidade de suas palavras – Disse Roberto tentando sem êxito aparentar calma, pois já estava bastante trêmulo e esforçava-se para articular as palavras. – Mas creio não ser necessário tal intrusão, até desrespeitoso eu diria, já que o lugar de corredor morto é no cemitério.

-          Está sendo bastante certo, porém deve aperceber-se de que estamos voltando para alertar você de que a corrida ultimamente vêm perdendo seus valores mais graciosos, veja bem que gostamos tanto de correr que queremos ajudar aqueles que ainda o podem fazer. Não recorda-se da lenda de Filípidis.

-          Sim, creio haver lido isto em algum livro.

-          Veja como, nesta lenda há grande valor heróico, e note como hoje perdeu-se este valor.

-          Não acredito – Contrariou Roberto.

-          Sua opinião é diversa do que ocorre.

-          Pois que seja, continuarei não acreditando.

-          Por quê – Perguntou o cadáver curioso.

-          Eu – Disse Roberto querendo fazer certo misto de sapiência com superioridade intelectual, o que deixava o morto por certo bastante inquieto, já que ele deveria ser o mais impressionante membro dos corredores por haver feito tão grande esforço para ressuscitar-se – Não me sinto influenciado por palavras de outrem, e nisto consiste em achar a corrida um ato de atroz heroísmo.

-          Assim queremos que seja, pois se você fizer esta propaganda lhe enviaremos 15% das rendas de nossas organizações.

-          Quê organizações seriam estas de que desconheço?

-          Temos uma delas que chama-se Defunto`s e companhia, responsável por corridas de longa distância.

-          Há é? – Perguntou sarcasticamente Roberto, já mais aliviado com a amistosidade da conversa, enquanto o prefeito se escondia cada vez mais trêmulo – De quê trata-se isto especificadamente?

-          Serve para ver quem consegue correr invisivelmente na frente de um corredor ainda vivo, e também para quem faz mais propagandas de corrida através de telemarketing.

-          Mas que coisa mais horrível isso, vocês não tem outra coisa a fazer?

-          Pois neste intento vim conversar com você.

-          Considero tal explanação acabada – Falou Roberto achando o morto de um gênio insuportável, pois jamais suportara a influência da mídia sobre a vida das pessoas.

-          Assim está, espero que leve em consideração algumas idéias que trocamos.

-          Claro, claro... – Disse Roberto com um olhar de desprezo.

      Com estas palavras o misterioso morto com muito esforço levantou-se e caminhou até a porta, indo talvez a um descanso eterno. Depois destes acontecimentos nunca ficou-se sabendo de nada que se referi-se ao assunto, porém muitos diziam que Roberto enriquecera de forma ilícitas nos últimos tempos, ninguém sabia com exatidão qual a maneira, de todos os boatos que corriam o mais apresentável era aquele que fora espalhado pelo prefeito que dizia que ele recebia 15% dos lucros celestiais. 

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