Thursday, October 31, 2024

18 - O discurso da lembrança

 

Décimo oitavo conto: O discurso da lembrança

      Num ambiente descontraído, sim, um “hapy hour”, estavam um grupo de amigos conversando sobre assuntos diversos, sim, assuntos fúteis, destes que se conversa no dia a dia. Não é de se estranhar que tudo o que se possa imaginar deve hoje ser rápido, fácil e lucrativo. Neste grupo de amigos entretanto havia uma excessão, sim, uma excessão, um senhor lá de seus 50 anos, bem vivido, que era lá na empresa considerado como bastante esquisito, estranho. Sim, um sujeito para lá de peculiar, seu nome era Adalberto, e portador de um aspecto sisudo, bastante sério, chegando até a ser de tão sério um tanto sombrio, alguns o consideravam louco, outros esquizofrênico ainda que tanto uns quanto outros chegavam ao consenso de notar sua criatividade fora do comun. Era Adalberto um senhor introspectivo, com cabelos já em pouca quantidade e olhos de profundidade hipnotizante, em geral pouco falava, mas quando resolvia soltar o verbo por certo sempre havia grande maquinação por trás do que viria à tona. Por isto, mesmo tendo uma fama não muito invejada era considerado nobre e de caráter correto.

      Foi nesta ocasião, naquele “Happy Hour”, entremeado num assunto loquaz e sem rumo certo ou nexo de lógica, que Adalberto decidiu interferir no assunto de maneira consisa e enfática, deixando os outros enquanto falava boquiabertos, causando à uns um assombro fora do comum, noutros uma atitude de devoção, paixão e um misto de contemplação e veneração.

-             Meus amigos, há muito pretendia dizer-vos algo, não obstante não encontrava momento oportuno para tal, e agora, justo neste momento, quando vejo que a sociedade, e nossa pequena sociedade sobretudo perde de si os valores mais profundos que podem perpassar um grupo, doando-lhes sentido, vigor, motivação e sentido de existência é que desejo exprimir umas quantas idéias.

-             Mas quê idéias são estas Adalberto? – Perguntou um homem franzinho, de óculos elegantemente pequenos – Há muito que não dizes nada, e agora, tão derrepente deseja falar?

-             Isto mesmo Marcos. – Falou Adalberto, sem direcionar seu olhar exatamente ao outro, mas deixando-o um tanto vago como se quisesse penetrar tanto em Marcos a ultrapassar seu corpo. – Há no mundo homens distintos entre si, no entanto a característica mais notável entre todos é a sinceridade, ao menos é isto que vejo nos olhos de cada um que aqui está. E mesmo que os assuntos sejam de caráter corriqueiro tenho a percepção de que este caráter somente se dá na razão e na lógica do pensar, mas que em sua essência se relacionam com um consciente mais profundo de cada um. Ao mesmo tempo que dizemos coisas banais transmitimos coisas profundas, é isto uma percepção que tenho.

-             Bastante plausível tuas idéias. – Disse um personagem, ao qual não vamos referir nem o nome nem a aparência para o leitor, mas sim que disse isto sem entender patavinas do que fora dito, em seguida propôs um brinde às fantásticas idéias do amigo com gestos empolgantes e vivazes.

-             Sim meus amigos. – Disse Adalberto, numa postura fechada e introspectiva, olhando para algum lugar que a quem o olhace imaginaria estar num longínquo horizonte. – Vamos brindar o dia a dia mundano, brindartemos as preocupações que ocupam toda a nossa capacidade de percepção da realidade, brindaremos a falta de silência, brindaremos a constante mácula que assola nossa vida.

-             Quê dizes? – Perguntou marcos bastante interessado.

-             Que os dias de hoje são tão profundos quanto os de ontem, o que se desvaneceu foi apenas a percepção de que tudo continua igual.

-             Estás desembestadamente louco este nosso amigo – Volveu o mesmo ingênuo que quiz brindar. – Curiosamente não tomou nenhuma.

-             Tomei sim meus amigos, no entanto o cálice foi mais amargo do que possam imaginar os senhores: o cálice da sabedoria, que traz consigo um peso incrível, pois, o triste é daquele que imagina saber quando na verdade se afoga na poça da ignorância, este é feliz quando percrusta obscuras sendas da perdição. O que já detém o conhecimento não se arrisca a ser feliz.

      Após este profético discurso todos ficaram por um momento em silêncio, num tom reflexivo, como no intento de decifrar caracteres que não conseguiram assimilar. Alguns com um ar de galhofa fizeram um ou outro comentário engraçado tentando demonstrar feições despreocupadas, o que era impossível dado ao fato de que foram atinjidos profundamente pelas verdades que haviam sido reveladas. Outros ficaram estáticos, completamente calados, numa postura eclesiática, quem prestou atenção percebeu claramente que alguns fios de cabelo de suas cabeças levantaram em reverência ao sábio que ali estava. Tanto uns quanto outros perceberam o peso moral da seriedade de Adalberto, pois aqueles que o levaram como um saltimbanco louco não sabiam que seus conscientes profundos o reverenciaram, os que ficaram em silêncio não entendiam exatamente o que fora proferido pelo homem, e talvez até por isto o respeitaram com afeição inequívoca.

      Após esta pequena conferência existencial Adalberto calou-se, sem reparar a reação dos circunstantes, simplesmente levantou-se, e num tom absolutamente fez menção de cumprimenta-los com as mão, gesto que não completou, olhando-os nos olhos por breves instantes abaixoi a cabeça, e como se quizesse ir embora virou-se no sentido da porta daquele estabelecimento, ficou ali parado, os que estavam sentados não entenderam, por isto ficaram sem reação sem sabr se chamariam-no de volta ou diziam thau. Foi pouco depois que ele virou-se novamente no sentido da mesa, e olhando à todos com profundidade e magnitudes inconcebível disse veementemente:

-             É meus amigos, há tempos venho recalcitrando em questões que me infundem desespero e alegria ao mesmo tempo, pois assim é todo o conhecimento perene, tem vertentes completamente distintas, é por isto também que se anula em si mesmo, e faz com que o tudo que se possa conhecer não exista. Mas não fujo ao assunto que aqui me traz novamente – Disse isto como se houvesse realmente ido embora e retornado mais uma vez, o que ninguém, definitivamente ninguém riu não porque não perceberam nesta questão, mas sim pela sinceridade a alcance daquele olhar incisivo. – Estou aqui novamente por causa das lembranças que me assolam, já pensaram vocês nas lembranças? Estas imaginações fugazes, fugidias, imprecisas que nos chegam em momentos que não são por nós escolhidos em horas presisas, senão como por vontade delas mesmas nos momentos em que elas julgam oportunos. Que para nós podem condizer com momentos inoportuno. Sim,sim: estas incontroláveis imaginações já vividas que nos perpassam pela mente numa cadência desordenada, que não chega tão somente à raz~```ào senão que audaciosamente chegam às sendas do coração, incindindo às vezes em fenômenos corporais como aumento da frequência cardiaca, e em explosões respiratórias. Há lembranças, vocês são vivas, têm vontade própria, todas vocês vivem dentro de min. Como são belas...

       Adalberto, num extase provocado por seu próprio monólogo curvou-se em reverência à suas próprias idéias, todos o olhavam embasbacados esquecendo-se até de onde estavam ou quantos pudessem estar notando a atitude distinta do comparsa.

-             Vamos Adalberto, todos entendemos suas idéias, que aliás são profusamente interessante, no entanto9 estamos com certos problemas que devem ser debatidos, não que isto não nos interessa, não, não, isto em hipótese alguma. Sabe, errr, é que tudo o que discorremos não é exatamente filosofico, quer dizer, até é, mas temos uma premencia de assuntos mais importantes, não que este não seja...

-             Cale-se! -  Gritou Adalberto impaciente, fazendo não só com que ele se calasse como ele mais metade do estabelecimento, o que foi tragicômico e dramático à todos os envolvidos com aquela cena pitoresca e pouco divertida. -  Não disponho de tempo para suas desculpas ignóbeis meu amigo, aliás devo ausentar-me para não pagar mais o preço de minha própria sabedoria, não que não seja educado porque isto julgo ser portador, mas não suporto que de maneira tão repetitiva o senhor permaneça nesta impertinência descabida. Senhores: Adeus!

      Assim Adalberto, o peculiar integrante daquele grupo deu meia volta e foi-se a passos firmes e resolutos, numa atitude brava e heróica, enquanto os outros se recompunham da maneira a transparecer o menor contrangimento possivel, o que efetivamente era utópico, dado às proporções da situação criada por Alfredo. É assim que a partir deste dia todos passaram a entendê-lo pouco melhor, aprendendo também que Adalberto não era somente um louco errante como um profundo provocador das situações mais diversas da vida, é no detalhe que se encontra a solução, é na profundidade que está a sinceridade, é na filosofia que está a verdade.

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